O aniversário será amanhã. A
ansiedade para chegar à maioridade durou os dezoito anos do menino, que esperou
angustiado para receber o grande presente de sua vida. Não era carro, não era a
independência financeira, não era o direito de sair de casa, não era viagem
para a Disney, muito menos uma big festa para ser apresentado à sociedade.
Naquela data, a mãe iria cumprir uma promessa feita quando ele ainda estava no
útero. Em cada comemoração, a criança, o adolescente, o jovem perguntava e a
mulher respondia a mesma frase: quando você fizer 18 anos eu conto.
E Olga cumpriria o dito. Não aguentava mais esconder o segredo diante de tantas
cobranças da família, dos amigos, do filho, sobretudo, dos vizinhos
mexeriqueiros que desejavam a informação mais do que qualquer outra pessoa da
face da Terra. Casada, separada, mãe de outras filhas do primeiro enlace, a
mulher era mestra na arte de ficar calada, de entrar muda e não revelar nada do
que ouvia enquanto participava da vida das patroas que a contratavam como cozinheira.
Especialista em comida boa, a mulher tinha o dom dos mistérios da cozinha e os
mistérios da própria vida. Sabia o ponto certo das quitandas como nenhuma outra
empregada da região do Centro-oeste mineiro, mas também sabia o quanto sua
revelação seria bombástica. Afinal, a gravidez do caçula só foi descoberta no
dia do parto.
Gorda,
bonachona, alegre, o perfil de Olga era facilmente reconhecido por quem a via.
Era olhar para ela, já diziam: essa tem a mão boa para o fogão. A gás, a lenha,
elétrico. Usava forno de qualquer espécie, e engordava à medida que
experimentava suas invenções, salgadas e doces. Um dia passou mal, desmaiou no
quintal, debaixo do sol quente, enquanto revirava os biscoitos que assavam no
forno de barro. O povo acudia dizendo que era pressão alta, a diabetes, o
colesterol, a falta de ginástica, o excesso de açúcar no sangue, a falta de
sal, o ar seco daquele mês. Ouvia-se de tudo. Lena, a filha da patroa, levou a
doméstica ao hospital. Carregada na maca, a mulher gritava de dor, sendo levada
para alguma ala de urgência. A acompanhante esperou notícias por horas, ansiosa
na portaria, onde ninguém possuía informação sobre o caso da cozinheira.
Na
chegada da noite, apareceu uma enfermeira, com sorriso aberto, estranhamente animada
naquele intenso plantão, com perguntas que soaram estranhas. Lena ouvia com
olhos esbugalhados a notícia que Olga acabara de parir um filho, mas todos de
sua casa desconheciam a gravidez. A pequena cidade do interior não sabia. A
mulher guardou nas gorduras o segredo da barriga grávida. A enfermeira insistia
na cobrança das roupas do recém-nascido. Tiveram que comprar um macacão às
pressas. Na loja, ainda pegaram uma manta e algumas fraldas. Desnorteada com a
novidade, nem se preocupou em combinar as cores. O menino misterioso foi para
casa como um arco-íris.
O
jovem relembrou a história, rolaram algumas lágrimas de felicidade. Nem se
importava com as chacotas, pois aprendeu que a mãe era assim mesmo. Divertia-se
com as confusões inocentes que ela aprontava. Ele também era do mesmo jeito,
puxou as características da mulher que o colocou no mundo. Aprendeu com o tempo
a ser reservado, quieto, porém astuto para conseguir o que deseja. Soube
esperar a passagem das estações para alcançar seu objetivo. Amanhã, na partilha
do bolo, iria fechar os olhos pela última vez, apagar as velas e fazer o
pedido: quero saber quem é meu pai. Olga prometeu e sempre repetia: essa
história é um capítulo que só será revelado quando você fizer 18 anos. Amanhã
será o dia.
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