Os
pés descansam na rede. O olhar vazio, perdido no balançar do tempo, descobriu
uma lagartixa escondida no meio das folhagens. Imóvel, silenciosa, predadora de
uma vítima que não aparecia. O pensador entrou no jogo da espera, imaginando o
que viria a seguir. O silêncio sumiu com um miado estridente no quintal.
Acordou do transe da brincadeira de vigiar o réptil urbano. O bicho não se
assustou e continuou estático. A calmaria retornou na casa.
A
cena instigante poderia causar repulsa, mas não havia nojo naquela troca de
olhares. A lagartixa estava à caça naquela tarde. Uma hora se passou e nada de
surgir o alimento. Somente piscadelas de ambos os lados. Cada um espreitando a
atitude do outro. Duas horas. Movimentos leves, quase imperceptíveis. O rabo se
curvou.
Nada.
Não acontecia nada naquele cenário. Precisava sacudir a poeira que já se
acumulava no corpo, porém a curiosidade era maior, como a espera do grand finale de um filme de ação.
Preocupado, pensou que aquela saga da natureza poderia durar o mesmo que o
longevo E o Vento Levou. Para quem já
fica impaciente com os somente 15 segundos permitidos por alguns aplicativos de
redes sociais, a expectativa era de esperança pelo desfecho daquela história.
Cento
e oitenta minutos contabilizavam no relógio de parede. O único barulho vinha do
ponteiro insistente que marcava os segundos daquela louca obsessão. Que pena da
lagartixa! Numa era excessiva de Aedes
Aegypti, nenhum mosquito deu o ar da graça nas bandas da arapuca. O cérebro
persistente naquela novela achou estranho o mundo animal. Por que o réptil não
usava sua agilidade para traçar outra estratégia e procurava um esconderijo
onde pudesse atacar alguma vítima mais distraída?
Sonolento,
não aguentou a força das pálpebras pesadas. O cochilo foi inevitável. Dormiu
como há muito não fazia numa quinta-feira, após o almoço. Era o primeiro dia
das férias. Teve o direito de procrastinar, sem culpa dos afazeres prometidos
quando estivesse à toa. A saga da lagartixa foi a salvação para a carcaça
cansada, que apagou no lento balançar da rede. Foi o remédio para o peso
acumulado do trabalho intenso nos últimos meses. Foi preciso acompanhar
pacientemente a paradeza da predadora para entender que o tempo, muitas vezes,
precisa de tempo.
Assustado,
despertou de um sonho que não recordava. Mirou na direção da folha que escondia
o minúsculo animal. Ainda estava lá, espreitando. De repente, com o espreguiçar
dos braços do seu observador, a lagartixa saiu de um torpor. Estaria ela em
estado de hibernação? Caminhou lentamente, escondeu-se entre as raízes da
planta. Quatro horas. O sono da beleza, o descanso merecido.
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