Cecília Meireles: será que é verdade?
Era domingo. Um calor de queimar
os miolos até debaixo das sombras. E as horas não passavam das nove da manhã.
Apesar dos olhos abertos, o sono dominava os pensamentos. Havia uma letargia
nas atitudes, porém uma dúvida instigava a curiosidade: Uberaba – qual a origem
do nome dessa cidade? Na infância, passei bons momentos nesse pedaço de terra
do Triangulo Mineiro, mas não havia feito tal pergunta. Uns vinte e cinco anos
depois, estava visitando a região novamente. Infelizmente, foi por pouco tempo.
Na noite anterior celebramos o casamento da minha prima Carol. Enquanto os
convidados ainda dormiam depois de entusiasmada festa, meu horário de retorno
para casa estava próximo. Ali, no Aeroporto Mário de Almeida Franco, tive um encontro
inusitado.
Na
sala de embarque, procuro um ponto de energia para carregar o celular. Ao lado
de um deles, há um casal conversando animadamente. Reconheço. São duas
celebridades da literatura nacional. Não tenho reação. Sentimento de fã. Fiquei
estático. Nélida Piñon, uma imortal da Academia Brasileira de Letras, olha para
mim e exclama: “você é escritor?”. Apontei para o peito, desacreditado que o
destinatário da indagação seria este mero mortal que aqui escreve: “eu?”. Ela
balançou a cabeça afirmativamente. “Eu tento ser, Nélida”, respondi com
intimidade e envergonhado. “Então você já é, pois se já tem vontade, já está no
espírito”.
Encontrar com os dois num bate-papo foi um aprendizado
Em
segundos, fiz um balanço no cérebro: “será que ela é vidente? Olhou na minha
direção e vislumbrou os sentimentos que tenho no coração? A grande escritora,
sem saber quem eu era, com carinhosas palavras de incentivo para mim? Logo eu
que, realmente, almejo ser um escritor?”. Fiquei emocionado, agradeci o
estímulo e repliquei: “Nélida, tenho como exemplo este grande sujeito. Quero
ser como ele”, apontei para o jornalista Xico Sá, sentado na outra cadeira.
“Você tem um mestre, meu jovem. Xico é um dos melhores”. Ele sorriu. O papo
fluiu.
Nélida
contou várias histórias: do amigo que era fã de Greta Garbo; dos mineiros que
são ótimos contistas; da admiração que ela tem pelo jornalista e escritor,
daqui das Gerais, Carlos Herculano Lopes; das viagens que ela fez para receber
e para entregar prêmios; do livro O
Vampiro de Curitiba, de Dalton Trevisan (que, por coincidência, eu havia
comprado na semana anterior); do Festival Literário de Araxá (de onde eles
estavam retornando); de um mistério da escritora Cecília Meireles. “Todo mundo
achava que ela tinha um sotaque carregado, voz forte, mas Cecília tinha a
língua presa”, relatou às gargalhadas. Tive uma aula de conhecimentos gerais em
apenas uma hora. Embarcamos. No avião, eu na poltrona 7A, Nélida na 7D, Xico na
7C. Seria o destino dizendo: “os escritores na mesma direção?”.
Estou cheio de
alegria por esse momento especial. Aprendi que para ser um grande escritor é
preciso ser curioso, saber de tudo, falar de tudo. Logo, fui fazer o dever de
casa. Antes do voo, recorri à Internet para descobrir que o topônimo
"Uberaba" é o nome de um rio do município, que se originou do termo
tupi Yberaba, que significa "água
brilhante", pela junção de y (água, rio) e berab (brilhante).
Sinceramente? Foi um fim de semana brilhante.
Leia mais:
* No site Bastidores da TV fiz uma crônica sobre um livro de Xico Sá.
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