Sérgio Murilo, Nelson Correa e Jaqueline
Sentado numa diversificada roda de convidados de uma festa, que se encontraram para comemorar o aniversário de um grande amigo, cometi alguns pecados quase imperdoáveis para os amantes da “boa” gastronomia. Comi salgadinhos fritos, esbaldei-me no refrigerante, lambuzei a boca na torta doce. No cenário, de frio típico bom-despachense, ainda saboreei um caldo de mandioca para “esquentar o peito”. O aniversariante, conhecido popularmente como Nelsinho, celebrava seus 30 outonos com a família, com os vizinhos e com algumas pessoas mais íntimas, mas eu fui o surpreendido durante o encontro. Lá pelas tantas horas da noite, à mesa, sentou-se uma menina com laço enfeitando o belo cabelo afro. De óculos, parecia uma dessas adolescentes introvertidas, que ficam caladas prestando atenção na conversa de adultos. Ela era diferente. E posso dizer que fiquei boquiaberto depois que começamos a conversar.
Jaqueline é filha do Sérgio Murilo e da professora Claudete. Lembrei-me do passado, quando passeava pelas escolas, das reuniões da Conferência de São Vicente de Paula, das missas das 19 horas na Igreja da Matriz; sua mãe caminhava grávida pela cidade. Quinze anos de história se passaram num flash. Eu a tinha “visto” no útero. E percebi como não conseguimos controlar o tempo. O embrião havia crescido e amadurecido. Desenvolta, a garota tinha assunto: bandas, filmes, celebridades. Porém, tudo culminava nos temas com que nós dois possuíamos mais familiaridade – séries de televisão e livros. Ela lê pelo menos um por semana, dos desconhecidos aos populares, inscritos nas listas dos mais vendidos. Nem haveria dúvida se ela me contasse que já conhecia também vários clássicos da literatura brasileira. Afinal, a mãe é um poço de sabedoria, ensina, principalmente, Língua Portuguesa, e o pai é um ser humano admirável.
Estranha é essa relação entre os conterrâneos de uma cidade. Mesmo não tendo intimidades, temos um fio que nos une de alguma maneira. Minha ligação com a Jaqueline remonta ao meu pré-escolar no Egídio de Abreu, onde fiquei apaixonado pela primeira vez, pois era alucinado pela professora que fazia estágio na minha sala. A estagiária, que também se chamava Jaqueline, era uma negra linda, com traços memoráveis, de uma beleza somente comparável às musas do carnaval brasileiro. Jovem, trilhando os rumos do magistério, deixou-nos muito cedo, retirada daquele convívio por causa de um trágico acidente. Perdi meu primeiro amor estudantil. Jaqueline, a adolescente, é sobrinha da Jaqueline, a professora. De propósito, o nome é uma linda homenagem feita pelos pais ao batizar a filha com as lembranças do sorriso inesquecível de uma das mais simpáticas mulheres nascidas na nossa cidade. Tia e sobrinha não se conheceram, mas têm muito em comum.
A jovem Jaqueline contou durante a festa que é candidata a vereadora mirim por um dia, numa eleição que vai escolher os representantes para a missão entre todas as escolas de Bom Despacho. Todavia, não tinha esperanças de ganhar por não ser a concorrente mais popular. Eu disse que ela podia pensar em estratégias de marketing, numa plataforma de propostas, num discurso para torná-la mais notória. Quem sabe assim conseguiria o posto tão desejado? Se eu fizesse parte do corpo de eleitores, ela já teria meu voto por causa de suas ideias, de sua inteligência, de sua simpatia, de sua alegria de viver. E, sobretudo, pela quantidade de livros que já havia lido, algo que nossos muitos políticos de verdade nem sonharam em ter acesso. À minha orientação, Jaqueline, muito cortês, respondeu com a artimanha de uma pessoa predestinada a ser estadista, que será ela mesma, que não mudará sua essência durante o pleito. E eu espero que, realmente, assim seja para sempre. Uma personalidade única, para fazer deste país um lugar bem melhor quando o assunto for a coletividade. Depois de conhecê-la, deu para acreditar que ainda haverá crianças que serão o futuro desta nação.
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