domingo, 24 de julho de 2016

RECORTES


Artistas buscam inspirações na natureza, nas musas, na contemplação do cotidiano. Sentimentos como ódio, amor, saudade, alegria, perdas e vitórias também são temas recorrentes em músicas, em pinturas, em filmes. Indiferentemente da época, tudo se mistura para formar a essência de cada uma das sete artes. Acredito que ninguém que precise se inspirar aja diferente. O que me questiono, e o que me deixa curioso, é saber qual é o local onde essas ideias surgem para depois se transformarem em algo concreto.

Quantas maçãs caíram na cabeça de Isaac Newton para que ele descobrisse a gravidade e postulasse a lei? Certamente, o cientista buscava o refúgio da sombra da árvore para refletir suas inquietações e, assim, na mistura de conexões neurais, ele encontrava respostas às suas pesquisas. Na observação do banal, tornou-se uma das grandes mentes já conhecidas. Porém, não havia banalidade em seus questionamentos, pois ele mesmo afirmou que “nenhuma grande descoberta foi feita jamais sem um palpite ousado". Ou seja, ao pé da macieira havia ócio, mas não faltava criatividade.

Os escritores Moacyr Scliar e Gabriel Garcia Marquez nasceram separados pela distância de suas nações e, obviamente, tiveram formações diferentes. Um era médico. O outro, jornalista. Valores familiares distintos, experiências únicas, leituras que desconhecemos. O primeiro, brasileiro, gaúcho, de Porto Alegre. Já o autor Nobel de Literatura, nasceu colombiano e foi morar no México para ter sossego. Nada parecido entre eles nessa superficial biografia que fiz, contudo, os dois escreveram textos sobre o cotidiano, cronistas de suas cidades, de suas caminhadas por aí, de personagens inacreditáveis. Tenho certeza de uma semelhança: a inspiração nascia do ser humano. Daqueles homens e mulheres que realmente existem para serem protagonistas de livros, de colunas de jornais.

Fico pensando que Leonardo da Vinci, Santos Dumont e os irmãos Wright brincavam de observar as nuvens e os desenhos imaginários que elas formavam. Faziam apostas com os amigos para quem adivinhasse o animal que surgia na imensidão branca que passeava pelos céus. Durante a diversão, pássaros voavam rasantes acima da molecada e sumiam buscando seus ninhos ou entravam na fila da migração rumo a poleiros distantes onde a comida era mais farta. A indagação dos meninos era a mesma: como voar? Cada um a seu tempo fez algo para que o homem ganhasse asas.

Minha inspiração, para aulas, textos, viagens, comidas, nasce num lugar inusitado. Debaixo do chuveiro, durante o banho, fico refletindo enquanto a água quente acalma a nuca. Noto que ali tem um ponto que agita o cérebro, ligando os neurônios para o pensamento. Dentro do box, escrevo linhas que ainda não ganharam caligrafia, invento o que vou cozinhar no domingo, faço percursos nos lugares que desejo conhecer andando pelo planeta. Lamento que ainda não exista um computador à prova d’água, para que eu possa já dedilhar as fantasias ao som dos pingos caindo no meu corpo.

Assim dedico esta crônica ao chuveiro, fiel companheiro, instrumento que me ajuda nos momentos de criação. Se tenho ferramentas como caneta, papel, teclado, não há dúvidas que o eletrodoméstico do banheiro também é fundamental para as aventuras que sonho em realizar, e que concretizo. Afinal, um bom banho resolve grande parte de muita coisa. 

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