domingo, 1 de dezembro de 2013

VOCÊ JÁ FOI PIOLHO?


As primeiras braçadas foram dadas na piscina pequena, quando uma bronquite atrapalhava a respiração e o médico recomendou natação como uma alternativa de cura. Na Praça de Esportes, nome popular da AAB – Associação Atlética Bondespachense, aprendi a nadar e fiz grandes amizades, passando ali momentos inesquecíveis até a adolescência. Foram emoções únicas. 

A voz potente do meu professor era ouvida até debaixo d’água. Com um apito, e sua gravidade vocal, Jorjão ensinava as técnicas de mergulho e as modalidades para a competição: crawl, peito, costas, borboleta. O mestre, famoso atleticano da cidade, desafiava-nos com sua intensa disciplina, com o intuito de nos tornar medalhistas. Fazer 50 metros em poucos minutos já era uma vitória suficiente para nos estimular. Nadei muito na área reservada para as crianças até conquistar o fundo da piscina maior, onde eu e meus amigos nos exibíamos em saltos mortais. Na beirada, fingindo melhorar o bronzeado, também comecei a admirar a beleza dos corpos que ali desfilavam. No clube conheci as circunstâncias do amor.  

Recentemente, voltei à Praça de Esportes para uma festa e flashes remontaram uma história de personagens que ali conheci. No bar, que já havia sido do meu pai, tive minha primeira conta como mensalista. Pereira, o dono, vendia coxinha, picolé, refrigerante, o melhor frango frito do mundo, e confiava em mim como cliente. Afinal, se eu não pagasse, meu progenitor acertava as dívidas depois.

Quando o toboágua chegou ao local, ficamos ansiosos para a inauguração do atrativo. Na época, com a ampliação da área de lazer, com as novas piscinas, um centro de atividades físicas, Pereira ganhou um concorrente. Quexada trouxe uma novidade no cardápio para nossos lanches, o salgado mais caro da estufa: um espetinho de frango que era a sensação do bar.  

Passei mais tempo ali do que brincando na casa dos “outros”, como diria minha avó. Se meus pais não estivessem trabalhando, com certeza estavam lá jogando buraco até de madrugada. Meus irmãos eram “piolhos”. A maioria dos meus amigos tinha cota e até quando a gente matava aula, o refúgio era certo. No período em que moramos no bairro Jardim América, era engraçado telefonar e pedir para chamar alguém da família. A pouquíssimos quilômetros de distância, dava para ouvir o João Mota gritando ao telefone: fulano, favor atender ao telefone na portaria.


Cada dia era um momento diferente. E com tantas recordações: brincar de segurar o fôlego para passar debaixo da perna de uma galera enfileirada, desafiar os colegas no mais prolongado mergulho e atravessar a piscina de ponta a ponta, ser o mais veloz na descida do toboágua, acertar várias cestas na quadra de basquete. Contudo, nada disso substituía o objetivo maior de descer quase que diariamente a Rua Tiradentes. Na Praça de Esportes, eu ia para me divertir, porém queria mesmo era passar em frente da janela da minha paixão, para ver minha musa no alpendre. E convidá-la, para viver aquele amor platônico, no parquinho, na roda gigante, no escorregador e na gangorra. Coisas de criança, mas lembranças intensas. 

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